sexta-feira, 30 de abril de 2010

Sertanejo se renova e invade espaços 'chiques'

Cabelo arrumado com gel, roupas e tênis de grife, o cantor sobe no palco do Clube A, casa noturna de elite paulistana, para se apresentar a uma plateia que pagou em torno de R$ 150 pelo ingresso. Durante o show, as fãs gritam como se estivessem diante de um astro teen como Justin Bieber ou os Backstreet Boys. A diferença é que Luan Santana não canta pop com influências de r'n'b mas música sertaneja.

Luan, aos 19 anos, é o novo fenômeno sertanejo. Com duas faixas (“Você não sabe o que é amor” e “Sinais”) entre as 100 mais tocadas nas rádios brasileiras e um fã-clube que inclui 200 mil seguidores no Twitter e mais de 500 mil membros no Orkut, seu sucesso é reflexo das mudanças pelas quais a música sertaneja passa nos últimos anos, se atualizando e “urbanizando os papos” como explica o cantor Sorocaba, da dupla Fernando & Sorocaba.

Compositor de “Meteoro”, primeiro grande sucesso de Luan, Sorocaba cita o seu hit “Paga pau” para ilustrar da mudança. “Antigamente, as letras das músicas falavam: ‘Peguei meu chápeu, fui para debaixo da árvore’... [Agora] não falam mais só disso. Hoje é: ‘Você finge que me odeia, mas no fundo paga pau’. É um papo jovem, que está na boca da molecada”, explica.

Ex-universitário
A dupla começou no interior do Paraná, quando Sorocaba e o companheiro estudavam na Universidade Estadual de Londrina, e é considerada uma das expoentes do chamado “sertanejo universitário”. O rótulo foi usado nos últimos anos para descrever artistas que começaram na faculdade e fizeram seus primeiros shows em festas universitárias, mas é por vezes questionado pelos próprios músicos. “Acho que a gente faz um sertanejo pop. Não é algo tão raiz quanto antigamente”, define.

Mateus, da dupla Jorge e Mateus, concorda com Sorocaba. “Muita gente fala em sertanejo universitário, por ter começado em bares de faculdade, mas é mesmo um sertanejo pop. Porque tem as características da música sertaneja, do dueto de vozes, mas tem guitarras e vários estilos musicais misturados.”

Fã de Zezé di Camargo e Luciano mas também de Radiohead e Killers, Mateus conta que separa um momento dentro de seus shows para covers de rock. “Eu sou guitarrista, então aproveito para tocar uns riffs, um AC/DC”, enumera.

Sinal dos novos tempos, a dupla gravou o primeiro especial sertanejo em alta definição para o canal Multishow HD. O show foi exibido pela primeira vez na noite desta quinta-feira (29).

‘Sertanejo chic’
O sucesso do sertanejo pop superou o círculo das festas de peão e das feiras agropecuárias e já invadiu espaços mais refinados. É o caso da casa noturna paulistana Café de la Musique, reduto da elite endinheirada de São Paulo, que tem trocado a música eletrônica pelo sertanejo pelo menos duas vezes por semana, às terças e domingos.

“Esse estilo, no Café, ganhou o nome de ‘sertanejo chic’. É uma música mais dançante, cantada por um pessoal mais jovem. No geral o público que tem ido nas nossas noites sertanejas não gosta de casas ‘country’. É um público bonito, não tem nada de brega”, conta a gerente de marketing da casa, Cláudia Gomes.

Ela diz selecionar os frequentadores pelo preço da entrada: no domingo os ingressos custam R$ 50 para homens e R$ 30 para mulheres. “Só para você ter uma ideia, a bebida mais vendida em noite de música sertaneja é champanhe, uma das mais caras da casa”, revela Cláudia.

Tobal Junior, gerente do Villa Country, tradicional casa paulistana especializada em música country e sertaneja, diz que seu público também está mudando. “Agora é mais democrático. Aqui é o reduto do cowboy, mas hoje a gente vê no Villa todas as tribos: o cara do surfe, o cara que gosta de música eletrônica”, conta.

Mesma música, de roupa nova
Diante do sucesso dos neosertanejos, até os artistas mais estabelecidos têm procurado se atualizar. Guilherme, da dupla Guilherme e Santiago, conta que chegou a mudar seu som no novo trabalho, “Tudo tem um porquê”, que já gerou o hit “E daí?”.

“Acabamos de lançar um DVD com um produtor que já veio de outras gerações, o maestro Pinnochio. Agora ele produz Jorge e Mateus, João Bosco e Vinícius. É a mesma música que eu cantava antes, mas com uma roupa nova. E isso deu uma reviravolta na nossa agenda. Está sendo ótimo”, comemora.

Para Guilherme, os novos nomes fazem parte de uma linha do tempo que segue atualizando o estilo. “Chitãozinho e Xororó e Zezé di Camarco e Luciano já eram diferentes de Milionário e José Rico ou João Mineiro e Marciano. Depois veio a nossa geração, com Bruno e Marrone, Edson e Hudson. Essa turma nova começou com César Menotti e Fabiano, depois veio Victor e Léo, Jorge e Mateus, Maria Cecília e Rodolfo, até chegar no Luan Santana”, enumera.

E, com a roupa nova, vem também um público mais jovem. “É impressionante ser reconhecido por criancinhas, de cinco, seis anos”, impressiona-se Luan Santana. “O que a gente está fazendo é inédito, atingindo um público que o sertanejo nunca atingiu. Eu quero fazer história na música sertaneja”, completa.

Rodolfo, da dupla Maria Cecília e Rodolfo, diz que também já encontra uma parcela infantil na plateia. “As crianças vêm, trazem os pais, avós. Elas gostam por ter a voz da Maria Cecília, é uma mulher cantando, elas se identificam”, afirma.

Assim como Maria Cecília e Rodolfo, que já disponibilizaram seu novo CD para download em seu site oficial, a maioria das duplas não tem receio de colocar seus MP3 na rede. “A gente começou a carreira na era da internet, tem que usar a ferramenta”, defende Rodolfo.

Fernando e Sorocaba, inclusive, fizeram o caminho contrário: em vez de lançar um álbum e depois colocar na rede as músicas, os ex-universitários gravaram o disco especialmente para o site oficial e, só depois, o transformaram em CD. “O ‘Acústico’ ficou tão legal que a gente teve que lançar em formato físico”, diz Sorocaba.

Luan, o mais jovem da turma, comprou até celular novo para poder atualizar o Twitter com mais frequência. “A internet é uma das únicas formas de eu manter contato direto com os fãs, então eu estou sempre ligado”, conta o astro.

Novas frentes
Já consolidada em estados do Sudeste e Centro-Oeste, outras regiões brasileiras já começaram a se render à invasão do sertanejo pop.“Quando você vê uma dupla como Victor e Léo tocando em um evento como o Festival de Verão de Salvador, sabe que as coisas estão mudando”, comemora Junior, do Villa Country.

Para Sorocaba, Luan Santana será um nome importante nessa missão. “Ele já é bem aceito no Rio, é um artista que abriu portas para o sertanejo lá”, afirma. Confiante, ele aposta que se consolidar no mercado carioca e nos estados do Nordeste é “o grande desafio da música sertaneja em 2010”.

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